Bom dia!

Olá pessoas. Eu de novo.
Bom, antes de tudo, tem um pequeno texto (ali em [mais]), por Marcelo Rubens Paiva sobre uma escola daqui de Sampa. Texto legal, já que eu estudei lá, e a mesma comemorou 50 anos no último sábado. Boas lembranças, e outras nem tanto. Depois eu comento. 🙂
E hoje faleceu um arquiteto em BH, Éolo Maia, autor de vários projetos interessantes (como o IAB/MG), e premiado em vários concursos.
De resto?
Trabalho, e trilha sonora dos 80’s. 🙂
Volto depois.


HUMANISMO X INDIVIDUALISMO
Os dois grandes paradoxos do Santa
MARCELO RUBENS PAIVA
ARTICULISTA DA FOLHA
Ser ex-aluno do Santa Cruz, ou simplesmente Santa, é como participar de uma confraria involuntária. Muitos se sentem membros de casta superior, cultivam esse estado, têm na agenda nomes de gerações de ex-alunos, trabalham cercados por deles, participam de encontros, e, provavelmente, seus descendentes estarão naquele espaço incomparavelmente amplo de Alto de Pinheiros.
Mas o que há de diferente no Santa? Dois grandes paradoxos. É uma escola de ensinamento humanístico da elite paulista, grande parte dela de doutrina individualista.
“É uma escola meio elitista, você sai de lá sem saber muito o que é a realidade da vida. Só se convive com gente da mesma camada social. Eu só fui aprender da vida realmente através do teatro. É um mundo meio fechado. Lá você não tem amigos gays, pretos, que não têm grana”, afirma Flávia Cauduro, 27, atriz.
Religião
“Você vive numa espécie de “redoma”. Percebi melhor isso quando fui estudar na Unicamp, convivendo com pessoas que tinham uma história muito diferente da minha”, lembra Cassiano Quilici, 42, que foi um dos muitos bolsistas da escola.
O outro paradoxo: é uma escola religiosa que, como todas, tem a missão de arregimentar rebanhos, mas desenvolve o espírito crítico do aluno. Como ensinar uma doutrina e também dar ferramentas para se duvidar dela?
“Tive aulas de catequese. Fiz primeira comunhão lá. Acho que, apesar da escola ser católica, isso não é algo muito forte lá dentro. As pessoas saem de lá com fé e com dúvidas sobre a religião católica. Das minhas amigas de lá, nenhuma vai à igreja”, diz Flávia.
“É um aparente paradoxo do catolicismo moderno. No momento da adolescência, em que há mais contestação, sugerimos um deslocamento para a ação social, voltamos o projeto para a ética e cidadania. Temos um curso de religião para abrir a visão e a consciência política”, explica Luiz Eduardo Magalhães, diretor-geral da escola.
“Nunca senti a mão forte da doutrina cristã. Tínhamos como professora de história, a famosa Zilda, que era de esquerda e, creio eu, não acreditava em Deus. Eu acho que ali houve, pelo menos no início dos anos 70, um colégio que foi um oásis no meio da violência surda e burra da época”, lembra Tadeu Jungle, 46.
“Era uma escola que incentivava o aluno a chamar o professor de você. O mestre era um cara a ser ouvido e ao mesmo tempo desafiado. A escola fazia com que você pesquisasse, em vez de dar tudo mastigado”, diz Jungle, cuja filha estuda na escola
Nos anos 70, ensinavam-se lógica aristotélica, Hegel e Marx Weber no primeiro colegial. Em seguida, mergulhavam todos nas experiências radicais do existencialismo, de Kafka a Sartre. Perturbava-se com Dostoievsky, o autor dos infernos humanos.
Por fim, a escola propunha uma saída tímida com Teilhard de Chardin, cuja filosofia, o “neo-humanismo”, encontra a síntese entre ciência e metafísica, e o autor cristão Emmanuel Mounier. O pensamento dialético jogava os alunos de um lado para o outro.
“A escola oscilava entre um projeto liberal e conservador. Minha mãe era educadora, e eu sempre tive um espírito crítico bem aguçado quanto à questão educacional. Atormentava um pouco os diretores com minhas críticas. Todas eram ouvidas, e nenhuma discutida. Os alunos tinham muito pouca participação no seu processo de aprendizagem”, diz Adriana Teixeira, 38.
Senso crítico
“Acho que o humanismo da escola, mesmo que impregnado pelo sentimento cristão, também colaborava para que as pessoas percebessem que eram seres sociais e que tinham um compromisso com essa sociedade, não necessariamente de reproduzi-la, mas até de transformá-la”, lembra o cineasta Roberto Gervitz, 43, que também foi aluno bolsista.
O senso crítico aguçado persegue os ex-alunos por toda a vida. Se há alguém que às vezes é ranzinza, cínico e tem um humor negro apurado, pode apostar, é um ex-aluno do Santa. Bem, essa descrição se encaixa comigo, porque, sim, sou um ex-aluno, testemunha das contradições, que se aprofundaram durante o regime militar: professores de esquerda, colegas no poder.
Em 1975, os alunos viram os professores Benauro Roberto de Oliveira e José Salvador Faro serem levados ao DOI/Codi, acusados de pertencerem a uma célula do PCB. Entre os alunos estavam o filho do governador Paulo Egydio e do prefeito Olavo Setúbal, ambos eleitos indiretamente.
“Nossa intenção sempre foi a qualidade de ensino, empregar os melhores professores. Havia no país um deserto de idéias. O ministro do Trabalho da época, Murilo Macedo, reclamou que dávamos textos de Marx. E chegou a haver uma invasão policial para impedir a exibição de um filme. Mas a escola tinha autoridade moral para ousar”, completa o diretor-geral Magalhães.
E ousavam. Os amigos da minha rua liam “Meu Pé de Laranja Lima”, enquanto eu lia “O Processo”. Meus amiguinhos estavam fascinados pelo filme “O Destino de Poseidon”, enquanto eu era levado pelo professor Amaury Sanches a assistir a “Teorema” (Pasolini), “Discreto Charme da Burguesia” (Buñuel), “Oito e Meio” (Fellini) e “A Chinesa” (Godard).
As meninas
Meus amiguinhos eram atormentados pelas orações subordinadas, enquanto meu professor Flávio Di Giorgi ensinava grego e latim. Meus amiguinhos só queriam saber de meninas. Eu estava me tornando um intelectual de calças curtas, fumava, era pálido, tinha insônia e sabia muito bem o significado de um pensamento dialético. Eles tomavam milk-shake. Eu tomava guaraná em pó, para ficar acordado e estudar.
As meninas do Santa eram lindas, mas a maioria delas vivia em crise existencial, fazia análise, tinha um olhar perdido em busca do significado da vida. Já as meninas da rua…