Inclusão Digital?

Esse provavelmente seria meu primeiro artigo mais ou menos sério no já atrasado “cubo”. O assunto? Inclui inclusão digital, educação, e assuntos afins. Mas como o assunto já vem remexendo minhas entranhas há um bom tempo, primeiro eu deixo aqui, e reproduzo por lá depois.
Em matéria recente publicada na Folha Online, o espanhol Roberto Aparici critica alguns aspectos do chamado “Computador Para Todos”, o tão festejado programa do governo para facilitar o acesso a computadores pessoais por camadas da população de menor renda. Antes chamado de “PC Conectado”, o programa prevê basicamente a isenção de tributos (PIS/Pasep e Cofins) para computadores que custam até R$ 2.500,00, e facilidades no financiamento de microcomputadores cujo preço à vista não ultrapasse R$ 1.400,00. Neste último caso, podem ser parcelados em até 24 pagamentos de R$ 70,00, um total de R$ 1.680,00.
O espanhol Roberto Aparici, diretor de mestrado de novas tecnologias da informação e comunicação da Uned (Universidade Nacional de Educação a Distância, espanhola), professor colaborador do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts, norte-americano) e professor visitante da UFBA (Universidade Federal da Bahia), afirma que o programa foi focado somente nos custos dos equipamentos, e não levou em consideração o que ele chama de “alfabetização digital”.
Ele pondera: “O programa pode facilitar o acesso das pessoas atualmente excluídas, mas a questão é: para quê? Se não souberem como usar a ferramenta para obter benefícios, ela servirá apenas para bater-papo, mandar e-mails, paquerar. Estamos na era do conhecimento, em que o valor está nas informações de qualidade.”
Por experiência própria, faz sentido.
Em primeiro lugar, qual o benefício que um computador pode trazer à uma família brasileira típica das “classes C e D” (classificação sócio-econômica baseada em estatísticas, mas que eu vou tomar a liberdade de usar aqui, uma vez que é usual, mas que mascara certos aspectos que não vêm ao caso), se o panorama real que temos hoje é de um completo empobrecimento intelectual, até mesmo daqueles das classes mais abastadas?
Dizem por aí que vivemos na era da informação. A questão é: para quê e como obtemos e utilizamos a informação. E ainda mais: como alguém pode ter discernimento e critérios, se mal aprende a ler, escrever, e realizar operações aritméticas simples?
E aí caímos de novo na questão da educação basal de qualidade (sim, eu sei que não estamos na Noruega), que dê instrumentos e conhecimentos suficientes para que o tal excluído digital faça uma progressão, que aprenda a pesquisar em livros, e depois passe ao mundo maravilhoso dos computadores e à supervia da informação.
O que me lembra do ridículo (na minha opinião), projeto de inclusão acadêmica, também conhecido como Cotas para minorias. Acho que os políticos com suas mirabolantes idéias de se ter um país que se distancie de Biafra não se deram conta de que o prejuízo é muito maior assim, com a inclusão (ou exclusão) na academia de alunos segregados logo no processo de seleção. Segrega-se para tentar se resolver um problema muito maior, e anterior.
Não que eu concorde com os valores abusivos (e talvez até realmente necessários) das inscrições, mas o que fica claro é que o trabalho e o empenho necessários para se colocar os alunos incluídos nas cotas é imensamente menor do que se precisaria para colocar em aplicação um projeto de educação fundamental decente.
Mas a política de cotas é, por definição, exclusiva. Excluem-se inicialmente os indivíduos que não pertencem às classificações étnicas contempladas. Excluem-se em menor proporção os de melhor condição financeira, e teoricamente melhor preparados. E acaba-se por excluir também aqueles que não pertencem às etnias contempladas, e que não possuem condições financeiras para concorrer de maneira semelhante aos alunos não cotistas. Estes vão, injustamente, concorrer contra os alunos muito bem preparados, os “não-cotistas”. Minha conclusão óbvia: o critério deveria ser sócio-econômico, e talvez (talvez mesmo), étnico.
Mas voltando à questão da inclusão digital, e desta vez sob o viés da minha experiência (não de especialista, mas de gente normal). A cada seis meses, mais ou menos, eu treino uma turma de 10 alunos, em uma faculdade pública, e portanto, integrantes de uma elite privilegiada. E o treinamento é ministrado como se ninguém entendesse patavinas sobre esses tais computadores. Tábula rasa. Desmonta-se um deles, exibe-se as peças, e tudo o mais.
E via de regra, pelo menos um destes demonstra uma dificuldade com os tais PC’s. Não conseguem entender o funcionamento, a lógica por trás do instrumento, da máquina. E aí eu me pergunto: como, de que maneira, uma pessoa que consegue ingressar em uma faculdade pública, não consegue de imediato compreender o que se passa ali por trás da tela do monitor? Não é por falta de formação, não é por falta de informação, e muito menos por falta de inteligência.
Sinceramente, eu não consigo imaginar que, uma pessoa que está muito distante desta formação, consiga atinar o que é possível fazer com um computador, sendo ele conectado, ou para todos, ou o nome que quiserem dar. Obviamente, por moto próprio e à custa de boa vontade e esforço é possível não sub-utilizar um instrumento destes.
Mas não é para todos, e será para muito poucos, se o instrumento vier assim, só, mas em suaves prestações.